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O que podemos aprender com emoções difíceis?

Rolando o feed das redes sociais há alguns dias, me deparei com duas moças explicando que não existe remédio para ressaca – escrevo esse texto na semana que antecede o carnaval – e que na verdade, os remédios que são vendidos para ressaca apenas camuflam os efeitos do álcool no corpo, mas que o corpo ainda estaria sofrendo com os efeitos nocivos do álcool, sobretudo no fígado. Elas continuam explicando que mascarar os sintomas é perigoso, uma vez que seu corpo pode estar entrando em colapso, beirando um coma alcoólico. Uma delas ainda salienta que se você tiver vontade de vomitar, vomite. Ou seja, a intensidade dos sintomas é proporcional ao quão danificado o nosso corpo está.

Bom, a essa altura você pode estar se perguntando o porquê uma psicóloga está falando sobre isso. Acontece que ao me deparar com essa situação, fiquei pensando em como nós tentamos fazer o mesmo com nossas emoções mascarando o que sentimos, sem prestar atenção no que está causando tal sensação indiscutivelmente difícil de ser experimentada, e o que ela indica.

Muitas vezes, recebo em meu consultório queixas como: “estou muito ansioso” ou “me sinto triste sem motivo”. Frequentemente escuto – e como ser humano também compartilho das sensações e pensamentos – “não queria sentir raiva dele (a)”, “perco a paciência com mais frequência do que gostaria”, ou até mesmo “me importo demais com o que fulano (a) pensa”.

É indiscutível que sentir algumas coisas é extremamente desconfortável e isso não pode ser invalidado, romantizado, muito menos banalizado. Todo sofrimento precisa ser cuidado. Ter pensamentos catastróficos e acelerados durante o dia, sentir o corpo tensionado, um aperto no peito, uma afobação, tristeza, indignação, raiva e tantas outras sensações que costumamos experimentar são fáceis de sentir, ainda mais quando a vida e as pessoas não param para que a gente consiga sentir.

Importante ressaltar aqui que há uma diferença gigantesca entre experimentar sensações difíceis e diagnósticos de transtornos mentais. É extremamente importante também passar por avaliação psicológica e psiquiátrica caso tais sintomas sejam frequentes e interfiram na sua qualidade de vida, então não hesite em procurar ajuda. No entanto, este texto não é sobre patologia, muito menos sobre diagnóstico de qualquer transtorno, embora seja um tema de extrema relevância e que precisa ser debatido e tratado com seriedade.

Por enquanto, me refiro a sentimentos e emoções que não são patológicos, que servem de mensageiros. Explico: muitas vezes, se olharmos com curiosidade para tais sensações desagradáveis, podemos entendê-las como alertas do nosso corpo e cérebro sobre quem nós somos, sobre nossa história de vida, sobre nossos valores e crenças, sobre estilo de vida, dentre tantas outras coisas que contam um pouco sobre nós como indivíduos únicos.

Costumo brincar com meus clientes que algumas emoções são quase como o sensor de ré do carro que apita muito alto e insistente quando estamos quase encostando na parede: o volume e intensidade do som é proporcional ao quão perto estamos de bater. É um som que soa até irritante, mas nos deixa em alerta e capta nossa atenção.

O seu estresse contínuo pode ser um sinal de como você tem aguentado mais demandas do que seu corpo suporta; a sua ansiedade antes de ir trabalhar pode te indicar que o lugar que você trabalha não é saudável; a sua indignação com sua família pode indicar que você está sendo desrespeitado; o seu medo de desagradar as pessoas que você ama é proporcional ao tanto que você as considera e não quer perder o afeto e admiração delas; a angústia de incomodar alguém pode indicar que você foi ensinado (a) que desagradar é sempre ruim; o perfeccionismo e o medo de errar podem indicar que você foi punido na sua história de vida ao cometer algum erro, e assim por diante.

Nosso cérebro foi feito para nos proteger, não para sermos felizes. Pensando nisso, da mesma maneira que nosso corpo sinaliza através de vômitos, dor de cabeça e estômago que ingerimos mais álcool do que nosso fígado pode metabolizar, as emoções nos indicam quando algo que é importante para nós foi ferido, ou tem perigo de ser ferido.

Se você parasse para pensar no que mais está doendo por aí, o que essa dor contaria sobre você e a vida que está vivendo?

Lembre-se de buscar por ajuda caso o sofrimento constante esteja presente.

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